A deputada Carla Zambelli (PSL-SP), aliada do presidente Jair Bolsonaro, anunciou que o apresentador e biólogo Richard Rasmussen, acusado de matar um boto para forjar uma denúncia apresentada no Fantástico, será Embaixador do Turismo.
Através das redes sociais, Zambelli afirmou que apresentou o biólogo ao ministro da Educação Abraham Weintraub. A deputada também publicou um vídeo no qual aparece ao lado de Richard, do presidente da Embratur, Gilson Machado, e do secretário de Ecoturismo André Pitaguari. Nas imagens, Machado afirma que o biólogo irá divulgar o ecoturismo brasileiro ao exterior por meio de palestras.
“Nenhum
país tem o recurso natural que o brasil tem”, disse o presidente da Embratur ao
exaltar a decisão de levar Richard ao governo para, segundo Machado, apresentar
aos estrangeiros “o que é o ecoturismo, quais são os recursos naturais que nós
temos, a nossa fauna, os nossos biomas”.
Durante o
vídeo, a deputada Carla Zambelli diz ainda que o que faltava para o Brasil era
a associação “de pessoas como você [Richard Rasmussen] com um governo que
realmente dê valor ao nosso país”. A declaração da parlamentar, no entanto, é
desmentida pelas atitudes do governo. Enquanto palavras vazias de defesa do
ecoturismo são ditas por Zambelli e seus aliados, retrocessos
ambientais têm marcado o governo Bolsonaro, como o aumento alarmante do desmatamento
na Amazônia, alcançando
19 hectares desmatados por hora em maio e um
crescimento de 57% em junho, quando comparado ao mesmo período do ano
anterior; a
mudança no Código Florestal para permitir maior desmate; o ataque às áreas
de proteção ambiental – como no caso de Angra dos Reis (RJ), onde Bolsonaro
pretende construir a Cancún brasileira, o que especialistas alertam
que devastaria a natureza local; entre tantos outros exemplos.
A verdade sobre Richard Rasmussen
Apesar de
Carla Zambelli tentar apresentar o biólogo ao público como uma pessoa que
entende e defende os animais e o meio ambiente, a verdade é outra. O famoso
apresentador de programas sobre a natureza está envolvido em crimes ambientais.
O pior deles está relacionado a uma grave acusação de que Richard teria dado
dinheiro a pescadores para que eles matassem um boto rosa com o intuito de
obter imagens chocantes para o Fantástico. A reportagem levou o governo
brasileiro a fazer uma moratória que proibiu a pesca de piracatinga durante
cinco anos para proteger o boto rosa, explorado como isca.
A
acusação foi feita em 2017 pelo documentário norte-americano A River Below (Um
Rio Abaixo, em tradução livre), do diretor Mark Grieco, exibido no Festival de
Cinema de Tribeca, em Nova York, nos Estados Unidos.
Ao ver as
imagens divulgadas pelo Fantástico, o documentarista decidiu vir ao Brasil para
documentar a matança dos botos. Ao chegar na Amazônia, ele recebeu relatos da
população local que indicavam que as pessoas que participaram da gravação feita
para o programa da Globo não pertenciam à comunidade e teriam sido levadas ao
local por Richard. Grieco decidiu, então, procurar esses pescadores e, após
aproximadamente seis meses de busca, os encontrou e ouviu deles outra versão
para a história exposta pelo biólogo no Fantástico. Segundo os pescadores,
Richard pagou R$ 100 a cada um para que reproduzissem práticas de caça ao boto
em frente às câmeras e garantiu a eles que as imagens seriam enviadas ao
governo e não a um programa de TV.
As imagens foram exibidas no Fantástico em julho de 2014. Nelas, uma fêmea
grávida de boto é caçada e cortada em pedaços, com um feto formado dentro dela,
que também é usado como isca. Na época, o programa de TV informou que os vídeos
foram cedidos pela Associação Amigos do Peixe-Boi (Ampa), da qual Richard é
associado.Após descobrir a versão dos pescadores, o documentarista procurou Richard. Inicialmente, disse que estava produzindo um documentário sobre botos e pediu que o biólogo falasse sobre seu trabalho com os animais. Em determinado momento da entrevista, no entanto, Grieco questionou o apresentador sobre a denúncia de que ele havia contratado pessoas para matar um boto e forjar uma cena para uma gravação. O questionamento deixou Richard irritado.
“Quando Richard descobriu que nós sabíamos o outro lado da história, nossa relação se tornou agressiva. Ele se sentiu traído, mas de alguma forma estava preso no filme, precisava continuar conosco e limpar seu nome”, contou Grieco a Diego Munhoz, do blog Central HQs.
Dano à fauna
Autuado pelo Ibama pelo menos oito vezes, Richard é acusado, entre outras
questões, de aprisionar animais silvestres em cativeiro e introduzir no Brasil,
sem autorização, espécies exóticas.Um dos escândalos envolvendo crimes ambientais praticados pelo biólogo é uma autuação por dano à fauna causada pela ação de Richard no Criadouro Conservacionista Toca da Tartaruga, de sua propriedade. O local foi fechado em 2005 devido a irregularidades. Dentre as questões expostas em uma nota publicada no site oficial do Ministério Público Federal, constam: “animais sem comprovação de origem e sem sistema de marcação visível, cães circulando em recintos destinados a aves e saguis, além de vários animais mortos na sala de atendimento veterinário”.
“Em vistorias e fiscalizações, o Ibama constatou que ao apresentar o projeto de criação do criadouro, em setembro de 1999, o responsável já possuía plantel de aves e répteis sem origem conhecida, além de fauna exótica sem a devida autorização. O próprio réu reconheceu irregularidades como o ingresso de 223 animais sem origem conhecida; evasão de 96 aves, pelo excesso de chuvas; 285 animais depositados pelos órgãos de fiscalização; 485 espécimes (ou seja, 95% do plantel) sem marcação”, afirma o site do MPF.
Em seu parecer, a procuradora regional da República, Marcela Moraes Peixoto, afirmou que ficaram comprovados os danos à fauna, consistentes especialmente no elevado número de mortes de animais pelas más condições do criadouro; nos maus-tratos aos animais; na receptação de animais apanhados na natureza, sem origem lícita; na introdução irregular de animais exóticos; na fuga de animais já acostumados à vida em cativeiro, sem o necessário acompanhamento de sua reinserção na natureza; e nos indícios de ainda maior número de mortes, fugas ou venda dos animais.
Devido às irregularidades encontradas no criadouro, Richard foi condenado, em primeira instância, ao pagamento de R$ 393 mil, acrescidos de juros moratórios de 0,5% ao mês, numa ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Após a decisão judicial, o biólogo entrou com recurso, mas não obteve sucesso e a condenação foi confirmada pela 3ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF3).
Biólogo manipula animais de forma irresponsável
A maneira como Richard Rasmussen manipula os animais durante as gravações de
seus programas é criticada por especialistas e foi alvo, inclusive, de uma
reportagem publicada em 2010 no Estadão, por meio da qual são relatadas
situações nas quais o biólogo estressa animais para que eles se defendam e as
imagens sejam feitas.“Numa tarde ensolarada, um inofensivo filhote de jararaca dorme num cupinzeiro no Parque Nacional das Emas, em Goiás. O bicho não percebe quando um homem se aproxima com um graveto na mão, e, de repente, o cutuca. Encurralado, o animal se defende e dá o bote. Na televisão, o filhote, que poucos minutos antes dormia tranquilo, é mostrado como uma cobra violenta e perigosa. Mas o animal não está fazendo nada mais do que se defender de um invasor, este sim, agressivo. Trata-se do paulista Richard Rasmussen, apresentador do programa Aventura Selvagem, que vai ao ar no SBT às sextas, às 21h20. Desde 2003, esse economista metido a aventureiro ganha a vida cutucando animais silvestres e exibindo as cenas em seu programa de TV – até o início deste ano, ele estava na Record”, afirma a reportagem do jornal, que chama Richard de “Indiana Jones de araque”.
Ao Estadão, o biólogo Valter Barrela, professor de ecologia da PUC-SP, explica que a ação de Richard estressa os animais. “Mas ele (Richard) tem de fazer o showzinho dele. Se ele não incomodar o animal, não vai ter audiência”, afirmou Barrela.
O oceanógrafo gaúcho José Martins, responsável pelo Projeto Golfinho Rotador, em Fernando de Noronha, também criticou o apresentador. “Ele interfere muito na vida do animal. Além disso, infringe a legislação ambiental. Os animais não podem ser perseguidos, manipulados, tirados da família, do ambiente em que vivem. E ele faz tudo isso”, disse Martins ao jornal.
A postura de Richard também foi questionada pela médica veterinária Clara Barcelos. Ela fez duas publicações sobre o assunto na internet que, somadas, ultrapassam 7 mil curtidas. “Além de todos os crimes, o que esse homem faz é um desserviço à educação ambiental. Manipular animais silvestres é algo que deve ser evitado ao máximo, por questões de bem estar. Quando essa manipulação vem a ser necessária (ex: casos de atendimento veterinário), deve ser feita com toda cautela possível. Isso porque o stress gerado pode desencadear uma série de alterações fisiológicas prejudiciais à saúde deles”, explicou a veterinária.
“Aí chega esse cara correndo atrás de bicho, pegando neles sem a menor razão (…) Tudo isso simplesmente pra impressionar pessoas e ganhar dinheiro. Funciona, claramente: olha o tanto que o cara é famoso. A população, por sua vez, não tem conhecimento do assunto e vem a achar normal essa conduta. Afinal, quem vai pensar que um biólogo em parceria com National Geographic é de conduta duvidosa? Apesar disso tudo ser abafado pela grande mídia, teve quem denunciasse e questionasse. Mas ele permanece aí: fazendo sucesso, executando seus programas e atividades normalmente, com isso tudo escondido debaixo do tapete”, concluiu.
(Foto: Reprodução/Instagram/@richardselvagem)
Fonte: anda.jor.br
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