O dia a
dia de um protetor de animais não é fácil. Demanda dedicação, tempo, dinheiro.
Envolve abdicar do individualismo e agir com altruísmo. Katia Pimentel é um
exemplo disso.
Protetora
desde 2002, a professora mudou-se para Florianópolis, SC, com seus quatro cães,
e logo já eram onze. A crueldade que ela via no bairro dos Ingleses não a
deixava virar as costas, e isso a tornou vulnerável aos que queriam “descartar”
um animal. Cães abandonados no portão de casa, arremessados para dentro. Com os
latidos, Katia foi denunciada, multada pela Prefeitura e perseguida por
vizinhos durante sete anos, até que resolveu se mudar para uma área rural de
Santo Amaro da Imperatriz, onde poderia viver em paz e ajudar os animais
resgatados.
O sítio foi todo estruturado para
os cães viverem com bastante espaço, seguindo as leis vigentes, mas antes mesmo
de se mudar, novas perseguições: um vizinho derrubou uma parede, órgãos de
fiscalização chegavam, cada vez mais exigências. A obra foi embargada e, por um
ano e meio, Katia morou de aluguel enquanto lidava com as demandas da
Prefeitura e da Polícia Ambiental. Mesmo dentro da lei, foi preciso pedir e
insistir para conseguir o alvará e, finalmente, se mudar.
Até então os vizinhos próximos só apareciam por lá aos
finais de semana. Foi quando o dono dos terrenos ao lado do sítio vendeu dois
deles. O pesadelo de Katia estava só começando. A nova vizinha aterrou parte da
cerca do sítio com a construção da casa, e por mais que Katia avisasse do risco
dos cães pularem, nada adiantou. Veio a chuva e o barro enterrou a cerca,
forçando a protetora a refazê-la.
No dia em que se mudou, Claudia (nome fictício) fez um
churrasco e as crianças chutando bolas na cerca provocaram os latidos dos cães,
que não tinha como Katia controlar. Isso fez com que a protetora fosse
denunciada não só pelos latidos, mas por seus cães ameaçarem os filhos da
vizinha. Katia teve que construir uma nova cerca a vinte metros de distância do
limite do terreno até para que os cães não ficassem sujeitos a alguma agressão.
Passada
uma semana, Claudia deu um rodo para cada filho e ordenou que batessem na cerca
e gritassem a noite, enquanto ela filmava, provocando mais latidos. Katia fez
boletim de ocorrência por perturbação, sem nenhum resultado. Por quase um ano
ouviu gritos, xingamentos, ameaças, que chegou a gravar em áudio. Seus cães
eram frequentemente levados ao estresse quando a vizinha, já de madrugada,
encostava o carro na cerca, ligava o pisca-alerta buzinava e colocava música
alta, para que os latidos, ainda mais altos incomodassem outros vizinhos e a
indispusesse com eles. A vizinha então começou um abaixo-assinado para que a
protetora se mudasse de lá, “sem obter assinaturas de vizinhos próximos, apenas
de amigos e conhecidos que moram longe dali”, diz Katia.
Após a
denúncia, Katia recebeu visitas da Vigilância Sanitária, da Polícia Ambiental e
da fiscalização ambiental da Prefeitura, e nada irregular foi encontrado. A
vizinha tinha ido longe demais, era um peso maior do que Katia poderia
suportar. Sem outros apoios e após um grave erro da sua advogada voluntária,
ela contratou dois outros advogados.
Katia afirma que algumas medidas
do Poder Público revelam claramente que ela vêm sendo perseguida. Por exemplo,
as obras do seu canil chegaram a ser embargadas por um ano e meio sob a
alegação de que ele ficava muito próximo de um pequeno curso de água. A
protetora demoliu o canil e o reconstruiu, atendendo a todas as exigências. O
prejuízo financeiro foi enorme, ela teve que pedir empréstimos que paga até
hoje, dinheiro que poderia estar sendo destinado aos animais. Tempos depois,
uma casa foi construída numa área igualmente próxima do riacho sem que, no
entanto, houvesse qualquer embargo. E a casa da própria vizinha que tem
reclamado também fica em área próxima desse córrego sem que as autoridades a
importunem por isso.
Katia diz que a zona rural têm problemas ainda piores em
relação à cidade. Nas proximidades do sítio, cães são descartados como coisas
em lixeiras comunitárias. Ela afirma que chegou a solicitar à Prefeitura que ao
menos estes pontos fossem iluminados, mas que lhe responderam não ser possível
nem a iluminação e nem providências sobre o abandono de animais. “Santo Amaro
da Imperatriz não tem qualquer programa de controle populacional de cães e
gatos”, diz a ativista.
O Ministério Público ofereceu denúncia à protetora
por não impedir o barulho produzido pelos cães, estranhamente propondo que ela
seja proibida de frequentar bares e boates, compareça em juízo todo mês para
justificar suas atividades e não deixe de se apresentar a comarca por mais de
oito dias. Ela recorreu e espera nova audiência.
Histórias como a de Katia não são incomuns.
Infelizmente, pessoas que se dedicam a dar esperança para animais
negligenciados, vítimas de maus-tratos e abandonados passam por situações como
essa diariamente. Ela não é uma acumuladora; já doou cerca de setecentos
animais, divulga em redes sociais, sites de ONG’s, feiras de adoção e em
Florianópolis sua atuação era reconhecida pela comunidade e alvo de matérias
positivas na imprensa. A tentativa dessas pessoas de preencher o descaso de
órgãos públicos nesse assunto é ainda mais dificultada pela comunidade que não
só deixa de agir, mas impede os que tentam, mesmo diante de tantos obstáculos.
Por Juliana Ribeiro
Fonte: Olhar Animal ( fotos: arquivo pessoal )
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