Álvaro Múnera era um toureiro em Medellín, na
Colômbia, que se transformou em um ativista pelos direitos animais. Depois de
um touro jogá-lo no ar duas vezes, a queda deixou Álvaro paralisado por toda a
vida.
Sua jornada rumo à recuperação envolveu
o reconhecimento de que a tourada é um esporte bárbaro. Hoje, ao invés de se
apresentar diante de multidões na prática assassina, o ex-toureiro trabalha
como conselheiro da Cidade de Medellín e cria leis de proteção animal, além de
arrecadar dinheiro para programas educacionais e de esterilização. Ele também
salva vidas, como a de Esperanza, a cadela que ele resgatou de um deslizamento
de terra.
Múnera começou a atuar nas touradas
aos 12 anos, depois de participar de uma simulação com bezerros durante férias
familiares no México. Seu pai levou a família a um restaurante chamado Cortijo
de la Morera, onde os convidados jantaram próximos a um local de touradas e
puderam se voluntariar para entrar na área. Álvaro se ofereceu sem hesitação e,
assim que a família voltou para Medellín, ele começou a ter aulas sobre
touradas.
Aos 14 anos, ele teve seu primeiro trauma
no ringue, pois testemunhou um açougueiro removendo um feto de uma novilha que
acabara de matar (novatos e jovens toureiros muitas vezes lutam com vacas, em
vez de touros). Ele gritou e regurgitou, declarando que nunca mais iria
participar disso.
Entretanto, seus amigos e seu
gerente o convenceram de que deveria continuar. Ele sabia que a experiência era
um sinal levando-o para um caminho diferente, mas escolheu ignorá-lo na época.
Três anos depois, ele se tornou um
campeão em Medellín, o que chamou a atenção de Tomás Redondo, o gerente de seu
melhor amigo e toureiro José “El Yiyo” Cuvero. Tomás queria levar os meninos
para a Espanha para atuarem como matadores.
Antes de partir para a Espanha,
Álvaro lutou na última vez na Colômbia durante um show de treinamento. Quando
ele esfaqueou o touro para terminar a luta, o touro não morreu. Então ele pegou
sua espada e fez isso repetidamente. Após a quarta facada, Álvaro observou como
o animal agonizou de dor por 15 minutos antes de finalmente dar seu último suspiro.
Novamente, Álvaro quis parar de fazer
isso, mas seu contrato já havia sido assinado. Tomás levou Álvaro e José para
touradas em toda a Espanha. Álvaro lutou 22 vezes no país até 22 de setembro de
1984. Na cidade de Múnera, que com ironia tem o mesmo nome de sua família,
Álvaro perdeu para um touro chamado Terciopelo, que o feriu na perna esquerda e
o jogou no ar.
A queda gerou uma lesão na coluna
vertebral não reversível na 5ª vértebra cervical que o deixou paraplégico e
destinado a viver em uma cadeira de rodas.
Álvaro passou seis meses no Jackson
Memorial Hospital em Miami, Flórida (EUA). Ele fez duas cirurgias e,
eventualmente, recuperou algum movimento em seus braços e mãos, mas nunca mais
poderia andar novamente.
Durante sua permanência na região,
ele conheceu muitas pessoas. Quando respondia suas perguntas sobre o motivo de
estar em uma cadeira de rodas, elas o comparavam a um assassino em série, que
merecia estar naquela situação.
Como cresceu em uma cultura onde a
tourada é considerada um “esporte cultural” nacional, ele nunca havia pensado
na extrema crueldade da prática. Após a rejeição que enfrentou em Miami, ele
começou a refletir sobre sua escolha.
Depois de uma pequena recuperação,
Múnera começou a fazer cursos no Miami Dade Community College. Ali, ele
conheceu uma garota e começou a namorá-la. O assunto de sua lesão ou sobre seu
passado nunca surgiu.
Um mês depois, um aluno informou a
garota o que havia ocorrido com Álvaro. Como era uma amante dos animais, ela
terminou com ele imediatamente, informou o Long Haul Trekkers.
Nesse momento, ele finalmente
percebeu que ele não tinha o direito de tirar a vida dos outros. Depois de
ignorar os dois primeiros sinais que quase o fizeram parar de ser toureiro, ele
finalmente reconheceu o terceiro, o sinal que o forçou a parar de lutar na
mesma cidade que tem seu nome.
Se ele não estivesse com Terciopelo,
nunca teria sido transferido para os EUA, onde a tourada é vista como uma
atividade cruel e assassina. Ele possivelmente continuaria apoiando essa
covardia que era o que conhecia.
Em uma tentativa de se redimir das
vidas que assassinou durante a juventude, Álvaro decidiu se tornar um defensor
dos animais. Ele atua na Câmara Municipal de Medellín desde 1997 e agora é o
líder político mais influente da cidade no que se refere ao combate às touradas.
Seu trabalho resulta na criação de
leis que protegem animais – a cidade promulgou 15 leis até o momento, incluindo
uma unidade de polícia contra a crueldade animal que investiga denúncias abuso
de animais, arrecadando dinheiro para unidades de castração móvel que castram
até 100 animais gratuitamente todos os dias.
Além disso, o ex-toureiro conseguiu o
financiamento para apoiar o La Perla, o primeiro abrigo sem mortes induzidas na
América Latina, que abriga mais de mil cães e gatos.
Se as touradas são protegidas como
uma “expressão cultural”, elas essencialmente acabaram em Medellín após
protestos convencerem uma grande porcentagem de colombianos de que essa extrema
crueldade não deveria continuar.
Embora o número de touradas anuais
permaneça essencialmente o mesmo, os números de frequentadores caíram na Plaza
de Macarena, de 12 mil lugares, em Medellín, com uma média que varia de cinco
mil e quinhentos a seis mil participantes desde 2008. Além disso, prefeitos de
cidades de todo o país expressaram rejeição às touradas.
Em 2015, um deslizamento atingiu a
cidade de Salgar, matando em torno de 78 pessoas, o desastre mais mortal na
Colômbia desde um terremoto de 1999.
Um amigo de Álvaro que é veterinário
visitou a cidade para ajudar as vítimas animais. Ele conheceu Esperanza, uma
cadela encontrada presa em um pântano. Ela era incapaz de caminhar, não reagia
e tinha fraturado o maxilar durante o deslizamento.
A cadela morava em uma oficina de
reparo de automóveis e tinha sido atropelada. Ela teria a morte induzida, mas a
injeção foi mal administrada e Esperanza conseguiu sobreviver nas ruas até o
incidente. Como Álvaro, ela era uma sobrevivente e ele imediatamente sentiu-se
conectado a ela.
Esperanza, que significa “esperança”
em espanhol, passou os dois primeiros meses com Álvaro e sua família. Ela
estava muito amedrontada. mas aprendeu a confiar nos seres humanos e agora irá
abraçar a primeira chance que já recebeu. Álvaro considera a ligação que tem
com a cadela uma relação de almas.
Além dela, ele também adotou diversos
outros cães abandonados que vivem com seu irmão em sua fazenda perto de
Medellín. Álvaro também resgatou dois burros, incluindo uma chamada Dulcinea,
que era explorada em corridas, que agora são proibidas graças ao trabalho do
ex-toureiro e de seus colegas.
Embora ele não possa apagar seu
passado nem compensar as muitas vidas que exterminou, Múnera e seus colegas,
membros do conselho da cidade e de grupos de proteção animal, são responsáveis
por algumas das leis mais importantes para os animais na América Latina.
Fonte:
anda.jor.br ( Fotos: Long Haul Trekkers )
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