Oito animais
resgatados pela Polícia Militar (PM) em ocorrências de farra do boi em
Florianópolis, que estavam sob a tutela da Associação Catarinense de Proteção
Animal (Acapra), foram abatidos sem aviso prévio pela Companhia Integrada de
Desenvolvimento Agrícola de SC (Cidasc). Os animais
tinham parte dos custos cobertos pela prefeitura de Florianópolis, e laudos que
comprovavam que estavam saudáveis. Eles estavam em processo de adoção para um
santuário vegano, que garantiria que tivessem direito à vida.
Renata Fortes, advogada da Acapra, diz que em
setembro do ano passado a Cidasc concordou com a doação, que seria feita a
propriedades de fora do Estado. Além da garantia de vida, outro motivo era a
segurança — os bois e vacas já haviam sido transferidos duas vezes devido a
ameaças de farristas, que chegaram a invadir o primeiro espaço arrendado pela
associação, em Ratones, na Capital. Desde então, o endereço era mantido em
sigilo em outras cidades no Estado, mas com consentimento da Cidasc.
Os resgates ocorreram depois que a Cidasc informou
ao Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), em 2017, que não acompanharia
mais diretamente as ações ligadas à farra do boi, e que cada município teria
que cuidar do destino dos animais. No primeiro resgate ocorrido na Capital, a
Diretoria de Bem-Estar Animal pediu um lar temporário à Acapra. A partir de
então, a associação passou a recolher os bovinos que foram vítimas da farra.
— Com a perspectiva de que eles seriam salvos, e não mais abatidos,
houve um novo estímulo para a Polícia Militar, que passou a resgatá-los — diz
Renata.
Os custos iniciais foram cobertos por doadores de
todo o país, por meio de “vaquinhas” online feitas pelo grupo Farra do Boi
Nunca Mais, administrado pela Acapra. Em abril, com seis animais recolhidos em
um espaço arrendado, a associação pediu à Cidasc orientações para legalizar os
animais. O órgão deu prazo para que a ONG descobrisse a origem dos bovinos. O
Ministério Público foi acionado para auxiliar na identificação.
Em setembro, a prefeitura de Florianópolis passou a
auxiliar com as despesas dos bois e vacas. Na página Farra do Boi Nunca Mais,
nas redes sociais, o prefeito Gean Loureiro (MDB) diz que durante todo o ano
passado o município esteve em contato com o Governo do Estado para regularizar
a situação dos bois. “Infelizmente partiu para a solução mais fácil e absurda,
abater os animais”, comentou.
Um ofício, assinado pelo prefeito e pela diretora
de Bem-Estar Animal da Capital, Fabrícia Rosa Costa, foi enviado no dia 19 de
dezembro ao ex-governador Eduardo Pinho Moreira (MDB) pedindo providências para
agilizar a transferência dos bovinos. O documento diz que, em setembro, o então
secretário de Agricultura e Pesca, Airton Spies, sinalizou positivamente para
que os animais recebessem brinco de marcação em nome da ONG, e pudessem receber
a guia de transporte para a doação a um santuário.
O ofício diz que os animais estavam microchipados e
tinham laudo de saúde emitido pela veterinária da prefeitura. “A manutenção dos
bovinos vivos e em bom estado de saúde é um compromisso assumido pelo município
perante a sociedade após posição favorável da Cidasc à legalização dos animais”,
diz o documento, que ressalta se tratar de um “esforço de destinação
humanitária”.
Segundo a Acapra, técnicos da Cidasc entraram na propriedade na
quarta-feira sem aviso prévio, com auxílio da PM, e carregaram nove animais
para um abatedouro. Além dos oito resgatados, um terneiro que nasceu após o
resgate da mãe. A vaca foi agredida prenha pelos farristas. Resgatados, os
animais ganharam nome: Ratna, Lótus, Davi, Hanuman, Shiva, Nandi, Bhargô,
Sidarta e Manu. Na manhã desta quinta, eles já haviam sido abatidos.
A Cidasc
sequer foi ver os animais. Se o abate sumário, que é uma das medidas e a mais
radical por ser irreversível, por que não foi adotada antes? Foram 10 meses de
irresponsabilidade da Cidasc? Essa contradição nós não vamos aceitar —
questiona Renata.
A associação
pediu uma audiência com o governador Carlos Moisés (PSL), para que explique o
que ocorreu, e uma explicação pública da Cidasc.
O que diz a Cidasc:
“A Companhia
Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (Cidasc) respeita todas
as manifestações em solidariedade aos bovinos recolhidos na Farra do Boi e que
estavam sob responsabilidade da Prefeitura de Florianópolis e da Associação
Catarinense de Proteção aos Animais (ACAPRA). Queremos deixar claro que todo o
nosso trabalho é voltado a garantir o bem-estar animal e a preservar a saúde
pública e dos animais, respeitando as diretrizes estabelecidas pela Organização
Mundial de Saúde Animal (OIE). Por isso queremos explicar alguns pontos
importantes:
– Santa
Catarina possui uma condição sanitária diferenciada de outros estados
brasileiros. Nossos rebanhos não são vacinados contra febre aftosa, sendo assim
não possuem anticorpos para combater essa doença. Para diferenciar o rebanho
catarinense, todos os bovinos e búfalos criados no estado possuem um brinco de
identificação. Bovinos e bubalinos sem esse brinco são considerados uma ameaça
à saúde dos nossos animais e, por isso, precisam ser abatidos. Essa decisão é
baseada na Lei Estadual n° 10.366, 1997 e Decreto Estadual n° 2.919, 1998.
– A entrada
em Santa Catarina de um animal doente, ou até mesmo vacinado contra febre
aftosa, representa um risco imenso e pode acabar com toda a produção de suínos
e de bovinos do estado. O impacto social e econômico seria avassalador,
principalmente na vida de milhares de famílias de produtores rurais que têm seu
sustento baseado na produção agropecuária.
– Os bovinos
recolhidos pela ACAPRA estavam sem o brinco de identificação oficial, sendo
assim não era possível comprovar a sua origem e nem as condições nas quais
foram criados. A falta do brinco oficial e da comprovação de origem dos bovinos
explica também a impossibilidade de transporte desses animais para outros
estados.
– É
importante destacar que os animais não foram abatidos por estarem sendo usados
na “Farra do Boi” e, sim, porque não estavam identificados com os brincos
oficiais e não tinham a comprovação de origem – podendo colocar em risco a
saúde de outros animais e da população. Toda essa situação foi causada porque
criminosos utilizam animais clandestinos para praticar a “Farra do Boi”,
considerada crime em Santa Catarina. Sem saber a origem dos animais, o risco é
iminente e o abate é obrigatório”.
Por Dagmara Spautz
Fonte: NSC Total (Fotos:
Reprodução Farra do Boi Nunca Mais)
Nota do Olhar Animal: Nosso mais veemente repúdio à
CIDASC e ao governo do estado de SC, representado por este órgão. A
legalidade da ação será esclarecida nos próximos dias e possivelmente
questionada na Justiça, porém sua IMORALIDADE é evidente. Os animais foram
sequestrados e ASSASSINADOS por pessoas que recorreram a um modus operandi
que burlou qualquer possibilidade de reação legal dos responsáveis pelos
animais. Foi uma ação COVARDE e nada condizente com a publicidade que deve ser
dada aos atos de órgãos públicos. Uma análise judicial mais minuciosa poderá
indicar se houve PREVARICAÇÃO. Nosso repúdio também aos pseudo-protetores que
nos últimos anos e falando em nome da proteção animal assinaram termos
CONCORDANDO com o abate pela CIDASC dos animais resgatados de farras de boi,
matança consumada mais uma vez neste ato repugnante. A postura “chapa branca”,
fisiológica, de troca de favores e de “lambeção de botas” de autoridades,
impediu que hoje haja uma resistência mais consolidada e institucionalizada
contra atitudes como esta, da CIDASC. Que os verdadeiros protetores de animais
consigam transformar essa brutalidade oficial em um divisor de águas, impedindo
futuros massacres promovidos por órgãos públicos.
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